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segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

E A PEDRA DA BATATEIRA ROLOU...*

 Conto de Cacá Araújo
Foto: Josermano Ferreira Oliveira

Ninguém poderia jamais imaginar que uma antiga profecia indígena pudesse ser concretizada. E o mundo viu...

O relógio marcava exatamente a primeira hora e trinta e três minutos e trinta e três segundos do dia vinte e oito de janeiro do ano que todos recordam.

Um forte e valente trovão anunciou a fúria da natureza. Choveu forte. A terra tremeu, pedras e troncos rolaram nas enchentes do rio revolto que, altivo e cheio de razões, exigiu de volta seu leito violado.

Como uma sinfonia estranhamente harmoniosa, misturaram-se sons da catástrofe e o clamor do povo. E foi triste o quadro de destruição. Casas, prédios comerciais, hospitais, igrejas, escolas, praças, ruas, pontes, postes de eletricidade, carros, tudo virando escombros... E dos prédios e casas as águas expulsando móveis, utensílios, pertences, produtos diversos e gente, umas inteiras outras já aos pedaços de carne e sangue, vitimadas pela agressão do grosso caldo que tudo arrasou e arrastou.  

Foto: Cacá Araújo
Súplicas e orações e preces e ladainhas entoadas em desespero: “Meu Deus! Cristo Jesus! Minha Nossa Senhora da Penha, piedade!”, “Pai nosso que estais no céu...”, Salve Rainha, Mãe de Misericórdia, vida e doçura, esperança nossa, salve! (...) A vós suspiramos, gemendo e chorando neste vale de lágrimas...”; “Creio em Deus Pai, todo poderoso, criador do céu e da terra...” “A nós descei divina luz...”.

Foto: Cacá Araújo

Foto: Cacá Araújo
Em meio aos estrondos e gritos e gemidos, ecoou a voz grave e temperada de pesar do ancião Cariri, ressurgido na escuridão da tempestade, trazido pelos raios vibrantes que avivavam o movimento das águas, sentado numa onda que nem subia nem caía, derramando gotas de lágrimas ancestrais:

- Viventes deste sagrado vale, provocadores da agonia e morte de muitos e milhares de antepassados, destruidores de florestas e animais, poluidores de nascentes e rios, ouçam e regravem onde couber que dissemos e avisamos há séculos que uma baleia por nós encantada ternamente dormia em sua cama de paz, escorando uma enorme pedra que tapava o grande e majestoso rio que vivia na barriga da Serra do Araripe. Criminosos, exploradores, especuladores! A desgraça que se abate sobre esta terra é uma resposta, uma reação aos desmandos... Vocês espremeram nossas águas num estreito e aleijado canal onde lançam seus esgotos e fezes. Queremos a vida de volta! Saiam do caminho, não se oponham à natureza e permitiremos que vivam os que escaparem da provação de hoje!

Naquele momento, a baleia já acordada se esticou como se espreguiçando e se debateu sacudindo a cauda e desgrudando totalmente o corpo da conhecida Pedra da Batateira. Uma nunca antes vista avalanche de água atirou-se com pedras e troncos sobre a região, quebrando o que restava de inteiro, inundando o que ainda estava às vistas, derribando monumentos heréticos, afogando e rasgando corpos de crianças, homens, mulheres, velhos e velhas, todos que estavam no caminho. Cumpriu-se, então, a profecia, e o sertão virou mar...

Ao cabo de trinta e três dias, as águas do rio baixaram, acomodadas que estavam no seu antigo e vasto leito. Peixes alegremente correndo correnteza acima e abaixo...

Foto: Cacá Araújo

Foto: Cacá Araújo
Num raio de pelo menos cinqüenta metros de cada margem restavam sinais da luta divina. Uma criança se aproximou vindo de longe. Achou um tênis que pertencera a alguém, uma chinela que um dia vestiu algum pé, uma camisa pequenina que havia agasalhado um bebê que se fora nas enchentes. Foi andando, brincando, até que ouviu vozes suaves e meigas em coro balbuciando uma cantiga de ninar. Pôs os pés na água, lavou o rostinho sereno e acompanhou o cântico, tendo ouvido, ainda, um último ressonar da baleia que voltara a dormir guardando águas...      

Foto: Cacá Araújo

Foto: Cacá Araújo

Cacá Araújo
Professor, Poeta, Folclorista, Dramaturgo, Ator e Diretor de Teatro
Diretor da Cia. Cearense de Teatro Brincante
Crato-Cariri-Brasil,18h31min. do dia 30bde janeiro de 2011.


* Alegoria da lenda cratense da Pedra da Batateira, no contexto da última enchente do Canal do Rio Grangeiro, em Crato-CE, na madrugada do dia 28 de janeiro de 2011, que provocou grandes perdas para a população, não havendo, felizmente, nenhuma morte. Este pequeno conto é um alerta à sociedade e aos gestores públicos, especialmente em níveis estadual e federal, que detém recursos e meios necessários à solução definitiva dos problemas relacionados
ao referido rio.

AINDA QUE FALASSEMOS A LINGUA DE GÁIA...


Quantos de nós já não ouviu falar dos perigos provocados pelos desastres ambientais que assola não só o Brasil, mas todo o mundo, aquecimento global, efeito estufa, ondas de calor todo esse vocabulário emblemáticos das discussões ambientalistas, se apresentam para nós , como uma falação desgastada, “clichês orgânicos”. Por que será?, que motivos nos levam ao total desapego a questões tão importantes e ao mesmo tempo tão renegada aos planos inferiores, que vão desde nossas práticas mais simples , de lavar nossas calçadas até a inoperância de políticas públicas incisivas que dêem cabo das pressões antropicas geradas, seja ,pela construção civil,seja pela interiorização da industria desenvolvimentista.

O que nos leva por exemplo, a ficarmos por alguns instantes emotivos com a situação dramática por que passa as comunidades interioranas das serras do Rio de Janeiro e logo após estejamos festejando a vinda de Ronaldinho Gaúcho para o flamengo por exemplo, sedimentando nossa atenção a outros olhares. A resposta é a mais cética e seca: NÃO É CONOSCO!!!, e esse sentimento tem tudo haver com a forma em que encaramos as nossas vidas, os valores que acumulamos ao longo dela, a disputa pêlo espaço ao sol, a luta diária pela sobrevivência, não nos permitimos em pensar naquele que do lado está. A sociedade de consumo na qual vivemos orquestrada pelo grande capital,nos forja, nos educa e como um dogma de fé, nos aprisiona em nossas próprias mentes para crermos que o ter, o poder, e o conhecimento, é particular, e somente os INDIVÍDUOS abastados e iluminados tem acesso a eles, que fazem pessoas acreditarem que existem humanos melhores que outros, sulistas melhores que nordestinos, intelectuais melhores que proletários, brancos melhores que negros e assim por diante, desde o advento da propriedade privada e o escambo dando espaço a moeda de troca, nós caminhamos da mesma forma, sozinhos, pesando que o mundo é nosso e que podemos escravizar as pessoas e de sobremaneira a NATUREZA.

A ocupação dos espaços, dessa vez, não desordenada, como nos casos das favelas, mas arquitetadamente planejada, burlando-se a frágil legislação ambiental, conseguido com o uso de subterfúgios que só os grupelhos da pequena burguesia política sabem fazer, licenciamentos ambientais de instalação e operação de condomínios luxuosos em áreas de encosta, nos leitos dos rios, gerando mais impactos ambientais, sem se quer manter projetos de ações mitigadoras, onde o Plano Diretor das Cidades são constantemente desrespeitados. Enfim, uma infinidades de ações individuais que trazem enormes conseqüências negativas ao meio ambiente assim como toda coletividade. A prova maior de tudo isso, é o que está sendo noticiado pelos meios de comunicação, onde, até o momento em que debulho em letras esse pensamento já morreram mais de 400 pessoas no Rio de Janeiro em conseqüências das chuvas.

Somente a partir do enrijecimento da legislação ambiental, com penas mais severas aos que insistem em desmanchar a Floresta do Araripe em carvão, por exemplo, secar nossos mananciais, traficar nossos fósseis, caçar nossos animais, e principalmente edificar condomínios em áreas de proteção ambiental, e acabarmos com práticas muitas vezes fisiologistas de órgãos ambientais e Secretarias INOPERANTES Municipais de Meio Ambientes e com políticas publicas que saibam promover ações de fato integradas com vistas a sustentabilidade real com as demais ações de governo, é que quiçá, poderemos enxergar melhor essas ambientais questões, de forma comum aos nosso dia-a-dia e não distantes do nosso vocabulário corrente.


Prof. Samuel Duarte Siebra
Biólogo

sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Lágrimas entre rios

Da varanda fotografo

A textura do barro que se fez homem

O rio que preso se revolta

As caras abismadas

As casas arrobadas

A lama maquiando o asfalto

O rodo espalhando a mágoa

E escondendo as lágrimas

Os pombos pousam no arco em paz

Os pés humanos se pintam de terra e água

Um mangue urbano vai se formando

Uma cratera vai se aflorando

A água vai afogando

As árvores vão se empilhando

Como lastimas de guerra

E o povo vai se ajuntando

Vai se espremendo

Uns assistem a novela do Rio

Outros tateiam a vida

Comungam com as suas mãos

A feitura de uma corrente

Composta de resistência

Entre os caranguejos

Transitamos no lamaçal

Nutrindo o sopro de ser humano castiçal.

Alexandre Lucas




quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

FESTA BREGA ROCK STYLE


A banda nasceu em novembro de 2006, quando cinco roqueiros que tocam em bandas de João Pessoa - PB, resolveram montar uma banda onde o seu repertório fosse recheado da bela música brega, da jovem guarda e claro, do Rei Roberto Carlos com seus sucessos dos anos 60/70,. Su estilo foi auto-intitulado como sendo "Brega Rock Style".

Os Caronas interpretam as músicas com muito respeito e admiração. Eles fazem pequenas alterações nos arranjos das músicas, mas, sem jamais fugir da idéia principal que o autor quis passar através da sua arte. O objetivo da banda é executar da melhor maneira possível, canções que marcaram um período da música popular romântica (nostalgica) brasileira.

A abertura da festa vai ficar por conta da banda "RED STEEL" de Juazeiro do Norte, que promete agitar a galera com belas canções do rock nacional.

FESTA BREGA ROCK STYLE


A banda nasceu em novembro de 2006, quando cinco roqueiros que tocam em bandas de João Pessoa - PB, resolveram montar uma banda onde o seu repertório fosse recheado da bela música brega, da jovem guarda e claro, do Rei Roberto Carlos com seus sucessos dos anos 60/70,. Su estilo foi auto-intitulado como sendo "Brega Rock Style".

Os Caronas interpretam as músicas com muito respeito e admiração. Eles fazem pequenas alterações nos arranjos das músicas, mas, sem jamais fugir da idéia principal que o autor quis passar através da sua arte. O objetivo da banda é executar da melhor maneira possível, canções que marcaram um período da música popular romântica (nostalgica) brasileira.

A abertura da festa vai ficar por conta da banda "RED STEEL" de Juazeiro do Norte, que promete agitar a galera com belas canções do rock nacional.

quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Crato-CE-Brasil: Obras de arte recuperadas estarão em exposição


Será realizada no próximo dia 30 de janeiro até 3 de fevereiro, Exposição das Obras do Museu de Arte Vicente Leite. Com o acervo restaurado, a exposição será realizada no Hall de entrada do Teatro Municipal Salviano Arraes Saraiva, com abertura às 19 horas do dia 30. Todo o material irá compor o Museu de Artes Vicente Leite, do qual faz parte o acervo a ser exposto. A Exposição será realizada por meio da Fundação Cultural J. de Figueiredo Filho e da Prefeitura Municipal do Crato.

Fonte:
Assessoria de Imprensa da Prefeitura Municipal do Crato
www.crato.ce.gov.br 
http://.prefeituramunicipaldocrato.blogspot.com 

segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

Hamurábi Batista – Um artista ponteiro





Os pontos de cultura é uma invenção que deu certo. Um dos exemplos vem de Juazeiro do Norte trata-se do Ponto de Cultura Mestre Noza que é gerido pelo ponteiro Hamurábi Batista. Neste Ponto de Cultura, os artistas agora tem a possibilidade de ter acesso gratuito a rede mundial de computadores, além de puderem fazer o registro dos seus trabalhos e isso é conseqüência do trabalho dedicado que vem sendo desenvolvido pelo artista visual e poeta Hamurábi, que recentemente ingressou no Partido Comunista do Brasil – PCdoB.

Alexandre Lucas - Quem é Hamurabi Batista?

Hamurábi Batista - Poeta, xilógrafo, bicho do mato, fruto da década mentirosa, pós ditadura, punk da década de 80 em Juazeiro do Norte.

Alexandre Lucas - Quando teve inicio seu trabalho artístico?

Hamurábi Batista - 1980, imprimindo as xilos gravadas pelo pai, em seu ateliê no fundo do quintal. No mesmo ano passou a escrever poesias nas capas dos cadernos, motivado pelas aulas de português e literatura do ginásio. Também passou a modelar com argila.

Alexandre Lucas - Quais as influências do seu trabalho?

Hamurábi Batista - O dia-a-dia, o rock’n roll, o jazz, o blues, os telejornais, a cultura popular, Augusto dos Anjos, Drummond, Bandeira, Abraão Batista, Mestre Noza, Chico Buarque de Holanda... Tom Zé, revolução.
Alexandre Lucas - Como você ver a relação entre arte e política?

Hamurábi Batista - A arte é livre, e penetra como o vento em todos os lugares que dêem passagem. Todas as coisas são boas, ruim é quem usa. A arte como instrumento formador de opinião, gerador da revolução. Tudo é política, a arte está em tudo. Reprovável podem ser as atitudes das pessoas, sejam na política, na arte, no convívio, no trabalho...
Alexandre Lucas - Seu trabalho é uma mistura do contemporâneo com o popular?

Hamurábi Batista - Exatamente, tudo que faço é resultado disso. Nasci em 1971, um dos piores anos da ditadura, fui adolescente na transição pra a “democracia”, então, acho estar ali o início da fusão. Não posso deixar de lado a tradição popular. Aquilo que mais quis provar era a liberdade de ser uma pessoa íntegra sem a necessidade de seguir padrão forjado pela ditadura, ou por preconceitos. As pessoas mais legais, são as mais simples... não dá para largar isso: o simples e o complexo, o antigo e o moderno. Uma coisa só existe em oposição a outra. Só existe o “sim” por causa da existência do “não”...

Alexandre Lucas - O que representa para você estar no comando do Centro de Cultura Mestre Noza?

Hamurábi Batista - Poxa, muito massa, sou um cara que dá maior valor para as coisas feitas das formas mais rudimentares, sem obrigação de utilizar os recursos modernos. A Associação dos Artesãos de Juazeiro do Norte, da qual sou presidente eleito pela assembléia geral, é exatamente isso, a auto gestão. Procuro integrar meu conhecimento, e minha escolaridade ao movimento, posso ajudar bastante, já conquistamos boas coisas juntos. O Centro Cultural Mestre Noza, gerido pela associação é esplêndido, magnífico, pua que palavras quando podemos constatar pessoalmente? Visite-nos: rua s. Luis, 96 (antigo quartel) centro.
Alexandre Lucas - Quais os desafios do Centro de Cultura Mestre Noza?
Hamurábi Batista - Todos os desafios estão ligados a um: o escoamento da produção. Este é o foco. Não adianta nada se não superarmos a dificuldade de comercialização dos nossos produtos, não dá nem pra pensar com fome, com dívidas, com planos adiados, frustrações...
Alexandre Lucas - Qual a importância do Centro de Cultura Mestre Noza ser Ponto de Cultura?
Hamurábi Batista - INTEGRAÇÃO, E INTERAÇÃO COM OS DIVERSOS SETORES, LINGUAGENS, E TIPOLOGIAS DA CULTURA E DA ARTE, POR MEIO DA REDE ESTADUAL E/OU NACIONAL DOS PONTOS DE CULTURA, O RECONHECIMENTO POR PARTE DOS GOVERNOS ESTADUAL E FEDERAL, AS OPORTUNIDADES E PERSPECTIVAS QUE SURGIRAM, E PODERÃO SURGIR A CURTO E MÉDIO PRAZOS, INCLUSÃO SOCIAL.

Alexandre Lucas - O Brasil vive um novo momento de caráter progressista na área das políticas públicas para a cultura. Como você percebe essa nova conjuntura?

Hamurábi Batista - Importante demais o fato dos recursos públicos para a cultura estarem passando pelas mãos das comunidades culturais, e dos artistas, através dos editais. Há muitas críticas sobre essa política. Vamos avançar sim, lógico. Vejo que antes não tínhamos nada além do abandono e da indiferença. Vamos em frente aprimorar isso conquistado. Buscar formas mais viáveis, eficazes, inclusivas. Há muita gente ainda sem saber escrever projetos, há muitos compatriotas ainda movidos pelo rancor, pelas seqüelas, vamos incluí-los, vamos libertá-los, já!...

Alexandre Lucas - Qual a contribuição social do seu trabalho, enquanto artista?

Hamurábi Batista - Procuro fazer com que as pessoas tenham a liberdade de utilizar o recurso proibido à minha geração: o pensamento, a libertação do preconceito, o rompimento das amarras. Busco a pitada, apimentada, o tempero para tornar mais quente, mais penetrante, mais perigoso aos decreptos.

Alexandre Lucas - Você agora é comunista?

Hamurábi Batista - Vou responder com uma poesia:
O QUAISQUERES
Qualquer coisa eu sou um monossílabo
Dividido em qualquer rima
Desigual
Qualquer ISTA que eu não seja
Natural
Sou um EIRO
Qualquer e impossível
Um talvez
Um tampouco
Ou um total
Numa medida qualquer
Que for possível.
Hamurábi
O velho punk com tendências anarquistas dos anos 80, recém filiado ao PC do B, simpatizante de Trotsky, puto da vida com Stalin, apaixonado por Dilma.
É isso aí, é isto aqui: artesanato é meio comunista, é auto gestão, é Canudos, é Caldeirão.

Alexandre Lucas - Como você ver a atuação do Coletivo Camaradas?

Hamurábi Batista - Poxa, tenho o Coletivo Camaradas como referência. Adquiri quando estudava na Urca, Letras. Do pouco que se salva naquela bodega. Com todo respeito aos colegas professores, e aos companheiros estudantes. O Coletivo Camaradas sempre será pra mim uma grande referência daquilo que há de bom.

domingo, 23 de janeiro de 2011

POR UMA POLÍTICA CULTURAL IDÔNEA

Texto de Luiz Monteiro

Joseany Oliveira, Carla Hemanuela, Cacá Araújo e Luiz Monteiro, em 20 de setembro de 2010, quando de uma das apresentações do espetáculo A COMÉDIA DA MALDIÇÃO, da Cia. Cearense de Teatro Brincante, no Teatro Rachel de Queiroz (Crato-CE)

Dias atrás, chegou ao meu conhecimento a insatisfação dos artistas teatrais do Ceará, para com o ilustríssimo governador do Estado, alegando que ele destinou uma verba de um milhão e oitocentos mil reais, para o pagamento de um cachê para as "Dionisíacas", espetáculos do Teatro Oficina, de São Paulo, concebidos pelo diretor José Celso Martinez Correa.

Em princípio, ameacei ficar indignado. Porém, antes, me passou pela cabeça a possibilidade da notícia não ser verdadeira. Acalmei a indignação e consultei um amigo do Crato, que é um daqueles guerrilheiros, entrincheirado na luta pela cultura e pelo teatro do seu estado. E ele me confirmou: a tal verba fora sim destinada para tal finalidade, em comemoração ao centenário do Teatro José de Alencar.

Já ia me indignando novamente, quando parei para pensar na tremenda ironia do destino: em vida, o nosso querido e cearense José de Alencar, que foi também um aguerrido defensor do nosso teatro, lutando, na época, não somente pela criação de uma escola de artes dramáticas, pelo poder público, como também para que o nosso imperador voltasse os olhos e apoiasse o teatro nacional; no que não foi atendido. Morreu, sem ver seus anseios realizados e não levou um centavo dos cofres públicos, sendo o seu teatro menosprezado na época e desqualificado contemporaneamente por alguns de nossos prestigiados acadêmicos, defensores intransigentes de nossa colonização teatral. E, no entanto, hoje, em homenagem ao teatro que leva o seu nome, parece que o senhor governador resolveu reparar a injustiça cometida no passado, destinando tamanha verba para as comemorações.

Assim sendo, pela terceira vez, ameacei indignar-me, mas constatei que já estava esgotada a minha cota de indignação, pois já me indignei outras tantas vezes com notícias deste tipo, e também com relação às leis de incentivos fiscais à Cultura e ao Teatro, em nosso país.

Devo dizer que não tenho nada contra o Zé Celso e muito menos contra o seu teatro. No entanto, pudera todos os artistas teatrais cearenses desfrutarem do mesmo benefício, e porque não dizer, do mesmo privilégio, sobretudo, em se tratando de um país como o nosso, tendo em vista os míseros recursos destinados ao teatro! Mas, sei que vivemos num tempo estranho, onde já não se abrem mais conflitos, onde não se promovem mais os diálogos acerca de certas questões e onde os inimigos são tantos e nenhum, dependendo apenas "do lugar de onde se vê".

No entanto, não posso deixar de falar da falta de contrapartida social no uso do dinheiro público e das leis de incentivo à Cultutra. Como bem questiona um dos artistas cearenses: "quantas montagens poderiam ser realizadas no Ceará com esta verba?" "Quantos grupos seriam favorecidos, se esta verba fosse dividida?" Quantas pessoas teriam acesso ao teatro, com o bom senso e uso equilibrado deste dinheiro?" E pergunto ainda mais: estas apresentações foram oferecidas gratuitamente à população? Quem estava dentro do teatro e quem assistiu a estes espetáculos? Qual a contrapartida social que ofereceu este dinheiro, que saiu do bolso de cada cidadão cearense? E me lembrando de Brecht... "Para tantas perguntas... tão poucas respostas!"

Mas, parece que tudo faz parte de um chamado "processo democrático". Eu diria que isso tem outro nome: democraritarismo! Ou, a ditadura de uma elite cultural, eurocêntrica, que nega ou não reconhece os valores locais e também aqueles que lutam, dia-a-dia, para construir e reafirmar a identidade um teatro regional de qualidade. É como diz o ditado: "santo de casa não faz milagres!" E eu diria: "Não faz milagres... e ainda incomoda!"

Entretanto, gostaria de dizer aos artistas e irmãos cearenses que o que acontece por aí, não é diferente do que acontece por aqui, uma vez que a perversidade por aqui é ainda maior. Por aqui, o dinheiro vai pra mais gente, com verba igual ou superior, passando por uma verdadeira "indústria da lei", em cujas panelas são triturados e consumidos milhões de reais, saídos dos suados bolsos dos cidadãos contribuintes. E aqui não vai nenhum ressentimento de quem nunca recebeu nada do poder público, pois acredito que, uma vez que este dinheiro existe para tal finalidade, ele deve ser destinado àqueles cujos projetos, ao passar pelo crivo da avaliação pública, tenha o maior alcance social possível.

Mas, que isso não deva servir de consolo, nem a vocês e nem a ninguém com um mínimo senso de justiça e brasilidade. Pode-se dizer que, num passado recente, assistimos ao surgimento de um grande monstro que se apossou, usufruiu e continua usufruindo do dinheiro público destinado à Cultura. E como diz a canção: "O monstro é grande e pisa forte!"

Diante disso, resta a todos nós, artistas de todo o Brasil, comprometidos com o nosso povo, com o nosso teatro e com a nossa Cultura, lutarmos, tornando pública a precária política cultural que rege todas as instâncias de poder em nosso país. E esta luta se traduz num ato de resistência pela preservação de nossa identidade cultural e de nossos valores artísticos, bem como pela criação de uma política cultural idônea, que leve em consideração o direito de toda a população, ao acesso aos bens culturais, preservando, estimulando e valorizando a produção cultural regional e de todo o nosso país.

Luiz de Assis Monteiro
Confraria da Paixão
Teatro de Raízes Populares
São Paulo
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