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quarta-feira, 16 de junho de 2010

A escultura de Fidel - Por Alexandre Lucas *


Sempre costumo incentivar meu filho ao fazer e pensar artístico. Numa destas vezes, ele tinha aproximadamente quatro anos e na sua inquietação de descoberta e criação me pediu cola, tinta e pincel. Logo pegou o suporte que iria desenvolver o seu trabalho, uma pedra ovulada e começou a pintar com tinta e cola. Em seguida pediu ajuda: “pai, corta esse pau pra mim”. Cortei, um graveto na forma de um cambito de baladeira e em seguida ele colou sobre a pedra. Ali estava pronta a primeira escultura desse camarada. Na hora, não prestei muita atenção na narrativa do trabalho, confesso, mas estava com ele no seu processo criativo, observando o universo dele. A arte carrega o universo do artista e, por conseguinte a sua visão social de mundo. Então, tudo que o artista e as crianças fazem vem de uma vivência e de uma relação com as pessoas e as coisas deste planeta, até mesmo, as mais mirabolantes histórias. Mas aquela criança de apenas quatro anos já sabia fazer arte? Aquilo era uma escultura? Ou um pedaço qualquer de madeira colado a uma pedra pintada? Isso talvez seja coisa da idade, qualquer criança pode fazer isso. Qualquer menino de quatro anos mexe com cola e tinta e já tem uma intenção, quando vai bulir com essas coisas. Com quatro anos, muitas crianças no seu desejo de ser capaz e de querer saber como funcionar as coisas, corta o cabelo pela primeira vez, sozinha. Se você não cortou o seu, certamente conhece alguém que já fez uma dessas traquinagens.

No outro dia, aquela pedra e o graveto me chamaram atenção. Pensava comigo, o que é isso? Tem coisas que é difícil entender, mas que continuamente devemos tentar enxergar para compreender os processos e as construções individuais e coletivas, enquanto constituições históricas e sociais. Neste caso, somente Fidel poderia ter a resposta. Perguntei a ele:

- Filho o que é isso?
- É um menino com uma mochila nas costas pai!

Achei estranho, como ele conseguia perceber o menino e a mochila e continuei a perguntar:

- Mas por que ele está deitado filho?
- Porque a mochila ta pesada pai!

Assim me calei, com dúvidas se aquilo era ou não arte, mas o que importa? Fidel, meu filho, pode me ensina o quanto uma pedra e um pedaço de graveto pode significar para a compreensão da arte e da vida. Até hoje guardo o pedaço de graveto e a pedra e uso em sala de aula para discutir que a arte carrega o mundo do artista.

*Coordenador do Coletivo Camaradas, pedagogo e artista/educador.

2 comentários:

  1. Alexandre Lucas, não canso de elogiar o brilhantismo dos seus textos, a coerência do que ele prega pra o que ele faz!
    SOU FÃ!

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  2. Linda Janinha...tem me dado gotas fortes de entusiasmo...esses textos são frutos das contribuições de pessoas como você que tanto vem contribuindo para a memória social do nosso povo.

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